“A Sociedade da Neve”: O relato do sobrevivente Roy Harley
Roy Harley relembrou o acidente que inspirou o sucesso da Netflix “A Sociedade da Neve” em uma entrevista exclusiva ao “Aventuras na História”. A produção conta a história da queda do turboélice bimotor Fairchild, em 1972, no Valle de las Lágrimas, que levava uma equipe de rúgbi do Old Christians Rugby Club, do Colégio Stella Maris, em Montevidéu, para Santiago (Chile).
“Me lembro perfeitamente de tudo… de sentir os motores do avião em potência máxima”, contou Roy Harley. “O pior foi a primeira noite na montanha. Foi como viver no inferno”. Um quarto dos 45 passageiros faleceu instantaneamente. O restante se acomodou no interior do que sobrou da fuselagem e fez paredes com as poltronas para tentar se protegerem do frio.
Além disso, os que resistiram dormiam abraçados e por curtos intervalos, a fim de evitar o congelamento. Mas as vítimas sofreram um duro golpe em sua luta: “Escutamos em um pequeno rádio, que eu tinha reparado, que as buscas haviam sido suspensas. Além disso, a notícia também veio de uma emissora uruguaia. Foi terrível, nosso país nos abandonou. O mundo inteiro nos dava como mortos”.
Apesar da dor, Harley explicou como o fato fortaleceu o grupo. “Foi um golpe muito duro, mas, ao mesmo tempo, ótimo para mudarmos nossa atitude: deixamos de ser passivos esperando e nos tornamos atuantes. Agora, nosso destino estava em nossas mãos”, cravou. “Nunca pensei que morreria na montanha. Eu queria viver para voltar e dizer aos meus pais e irmãos que eu estava vivo. Esse era o motor que me movia”.
Roy também falou sobre a decisão de se alimentar dos restos mortais de seus companheiros de viagem. Após acordo entre os sobreviventes, a repartição começou no oitavo dia: “A decisão de usar os corpos de nossos amigos como fonte de energia foi mais simples do que muitos imaginam. Estávamos no fundo do poço, não havia outra alternativa. Estávamos em uma geleira com neve ‘eterna’ e só havia gelo e pedras. Não havia outro caminho”.
Para piorar a situação, pouco antes do vigésimo dia, uma avalanche atingiu o resto da fuselagem, e os sobreviventes ficaram cobertos pela neve. “Parecia que merecíamos tudo o que estávamos vivendo”, contou Harley. “Ficamos por quatro dias enterrados pela neve e dormindo com os corpos de oito de nossos amigos”.
Em 12 de dezembro de 1972, quando o acidente já completava dois meses, o grupo organizou uma expedição rumo à montanha, a fim de obter visibilidade e resgate, que chegou somente dez dias depois. “Encontrar com minha família em San Fernando foi uma sensação rara – tanto para eles quanto para mim”.
Sobre as lições obtidas na luta pela sobrevivência, que durou dois meses, Harley pontuou: “Valorizar o momento que vivemos; não esperar ajuda de ninguém; não subestimar as pessoas nem a nós mesmos; não se queixar, mas agir; dar, entregar e ser solidário; manter a esperança, sonhar e, por fim, agradecer”.
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